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Aplicativos de transporte e equidade: um estudo de acessibilidade em Porto Alegre/RS

Resumo

A chegada dos aplicativos de transporte ao Brasil gerou preocupações quanto a seus impactos negativos na mobilidade urbana, porém havia a expectativa de um serviço complementar aos sistemas públicos e de substituição dos automóveis privados, aumentando, em tese, a acessibilidade das cidades e podendo reduzir as desigualdades na mobilidade urbana. Este estudo avaliou essa hipótese em Porto Alegre/RS, descrevendo o acesso de diferentes grupos socioeconômicos aos principais destinos da cidade por meio de um indicador de acessibilidade composto por tempo e custo monetário. Os resultados indicam que os aplicativos aumentam fortemente a desigualdade entre os estratos, especialmente em viagens frequentes. Porém, eles podem ser uma opção viável para deslocamentos ocasionais até para a população de baixa renda.

aplicativos; acessibilidade; equidade; desigualdade

Abstract

The arrival of ride-hailing apps in Brazil has raised concerns about their negative impacts on urban mobility. However, it was expected that they could serve as a complement to public transport and as a substitute for private cars, theoretically improving urban accessibility and potentially reducing inequalities in urban mobility. This study assessed this hypothesis in the city of Porto Alegre/State of Rio Grande do Sul (RS) and described the access of different socioeconomic groups to the city's main destinations using an accessibility indicator composed of time and monetary cost. Results indicate that ride-hailing apps significantly exacerbate inequality between income groups, particularly for frequent trips. However, they can be a viable option for occasional trips even for low- -income communities.

apps; accessibility; equity; inequality

Introdução

A década de 2010 marcou a chegada dos aplicativos de serviço de transporte motorizado individual ao Brasil. Trazendo um serviço conhecido nos países de língua inglesa como ride-hailing, essas companhias privadas têm como negócio oferecer um transporte por veículo privado individualizado, buscando ocupar um nicho nos serviços de transportes urbanos (Dudley, Banister e Schwanen, 2017). Elas apresentam-se como um serviço similar ao táxi convencional com mais conveniências, como a forma de solicitação (por aplicativo móvel), preços geralmente mais baixos (em geral, isento de regulações estatais) e a grande oferta de veículos, em todas as horas do dia (Rayle et al., 2016RAYLE, L. et al. (2016). Just a better taxi? A survey-based comparison of taxis, transit, and ridesourcing services in San Francisco. Transport Policy, v. 45, pp. 168-178.). Em relação aos táxis convencionais existem importantes diferenças quanto a regulamentações dos veículos e dos motoristas que prestam o serviço, sendo as permissões de táxis, via de regra, mais rigorosas.

Tal serviço é responsável por um volume muito grande de deslocamentos nas cidades brasileiras. A Uber, empresa com a maior parcela de mercado no País, reporta contar com 1 milhão de motoristas e entregadores “parceiros” e 30 milhões de usuários em mais de 500 cidades brasileiras (Uber, 2023). A 99, principal concorrente em nível nacional, informa contar com 600 mil motoristas cadastrados e 18 milhões de usuários em mais de 1.600 cidades (99, s.d.). Dados sobre o número de viagens não são públicos (provavelmente devido a questões de mercado e concorrência), porém ambas já noticiaram terem chegado à marca de um bilhão de deslocamentos – a Uber em 2018UBER (2018). Uber chega à marca de 1 bilhão de viagens no Brasil. Disponível em: https://bit.ly/3YATany. Acesso em: 10 ago 2023.
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e a 99, em 2020 (Uber, 2018UBER (2018). Uber chega à marca de 1 bilhão de viagens no Brasil. Disponível em: https://bit.ly/3YATany. Acesso em: 10 ago 2023.
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; 99, 202099 (2020). 99 atinge marca de 1 bilhão de corridas. Disponível em: https://99app.com/newsroom/99-atinge-marca-de-1-bilhao-de-corridas/. Acesso em: 10 ago 2023.
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).

Tais empresas são conhecidas por serem uma das faces da “economia do compartilhamento” na área da mobilidade urbana, tratando-se de um modelo econômico que fornece acesso a bens e recursos sem que haja necessariamente uma relação de posse, através do compartilhamento entre diferentes pessoas, e a popularização da internet e das redes sociais foi fundamental para a solidificação dessas dinâmicas (Martin, 2016MARTIN, C. J. (2016). The sharing economy: a pathway to sustainability or a nightmarish form of neoliberal capitalism? Ecological Economics, v. 121, pp. 149-159.; Puschmann e Alt, 2016PUSCHMANN, T.; ALT, R. (2016). Sharing economy. Business & Information Systems Engineering, v. 58, n. 1, pp. 93-99.). Alguns autores se referem a esse modelo como “neoliberalismo com esteroides”, por ampliarem os limites da doutrina neoliberal para aspectos da vida anteriormente fora do alcance do mercado, pela falta de regulamentação governamental nas áreas em que operam (e realizarem lobby oposto a regulamentações contrárias a seus interesses comerciais) e pelas relações de trabalho precarizadas que são observadas (Cockayne, 2016COCKAYNE, D. G. (2016). Sharing and neoliberal discourse: the economic function of sharing in the digital on-demand economy. Geoforum, v. 77, pp. 73-82.; Martin, 2016MARTIN, C. J. (2016). The sharing economy: a pathway to sustainability or a nightmarish form of neoliberal capitalism? Ecological Economics, v. 121, pp. 149-159.).

Tais iniciativas comerciais são baseadas em uma estratégia de “inovação disruptiva” (típica do contexto do Vale do Silício, nos Estados Unidos, de onde surgiram) e são sincronizadas com ideias de transformação e necessidade imperativa de mudança. Importante ressaltar que essa “necessidade” de mudança, ancorada nas mesmas ideias de esgotamento de recursos naturais e de busca por sustentabilidade, visa basicamente à manutenção das taxas de lucro do capital e à sobrevivência do próprio capitalismo, uma vez que os empresários percebem o esgotamento de determinados negócios, como a venda massiva de automóveis individuais, e propõem novos modelos mais adaptados aos tempos atuais.

Empresas desse meio costumam surgir sob a forma de startups (empresas emergentes de inovação tecnológica) e crescer através de investimentos externos. No caso das empresas por trás dos aplicativos de transporte, é normal que mesmo após mais de uma década de operação elas ainda não gerem lucro, pois optam por seguir expandido seus negócios e fidelizar clientes através de descontos ou tarifas mais baixas, na tentativa de vencer as empresas concorrentes no longo prazo (Mota, 2019MOTA, C. V. (2019). De Uber a Nubank: as empresas que valem bilhões, mas nunca registraram lucro. Disponível em: https://economia.uol.com.br/noticias/bbc/2019/09/30/de-uber-a-nubank-as-empresas-que-valem-bilhoes-mas-nunca-registraram-lucros.htm. Acesso em: 14 jun 2021.
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). Isso é possível, pois elas continuam captando recursos de investidores ou se tornaram empresas de capital aberto, caso da Uber (Bertão, 2019BERTÃO, N. (2019). Uber capta US$8,1 bilhões no IPO, bem abaixo do que sonhava. Disponível em: https://valorinveste.globo.com/mercados/renda-variavel/empresas/noticia/2019/05/09/uber-capta-us-81-bilhoes-no-ipo-bem-abaixo-do-que-sonhava.ghtml. Acesso em: 14 jun 2021.
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). Ainda, há uma grande expectativa de, no futuro, o serviço de ride-hailing funcionar através de carros autônomos sem motoristas, diminuindo substancialmente os custos de operação das empresas e possibilitando que passem a obter lucros.

A aparição dos aplicativos no Brasil, em 2014, é simultânea ao começo de um período de queda no uso do transporte público. Segundo a Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU, 2022NTU - Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (2022). Anuário NTU: 2020-2021. Disponível em: https://www.ntu.org.br/novo/upload/Publicacao/Pub637677328510412847.pdf. Acesso em: 10 ago 2022.
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), de 2013 a 2019 houve um decréscimo de 26% no número de passageiros equivalentes transportados por mês nos sistemas de ônibus de nove das principais capitais do País, sendo as quedas ainda mais relevantes quando analisados os anos de 2020 e 2021, fortemente impactados pela pandemia de covid-19. Outros fatores, como a recessão econômica que se intensificou a partir de 2015, podem também ter contribuído com a queda de demanda, porém diversos estudos já mostraram que, tanto no Brasil quanto no resto do mundo, aplicativos são responsáveis por “atrair” um número expressivo de pessoas que estariam se deslocando por transporte público (Rayle et al., 2016RAYLE, L. et al. (2016). Just a better taxi? A survey-based comparison of taxis, transit, and ridesourcing services in San Francisco. Transport Policy, v. 45, pp. 168-178.; Henao, 2017HENAO, A. (2017). Impacts of Ridesourcing - Lyft and Uber - on Transportation Including VMT, Mode Replacement, Parking, and Travel Behavior. Tese de doutorado. Denver, College of Engineering and Applied Sciences. Disponível em: https://www.proquest.com/openview/5486ff6cc229889a3cdf2df1cd3993cb/1?pq-origsite=gscholar&cbl=18750&diss=y. Acesso em: 8 set 2022.
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).

Ainda, a ascensão dos aplicativos aconteceu em um momento histórico de intenso debate acerca da mobilidade urbana no País que, em 2013, havia passado por uma série de manifestações em nível nacional que se iniciaram como protestos contrários ao aumento das tarifas do transporte público nas principais capitais (Verlinghieri e Venturini, 2018VERLINGHIERI, E.; VENTURINI, F. (2018). Exploring the right to mobility through the 2013 mobilizations in Rio de Janeiro. Journal of Transport Geography, v. 67, pp. 126-136.). As demandas da população eram associadas ao aumento no custo de um serviço que é essencial para a população de baixa renda e que, historicamente, é pouco confiável e superlotado (Vasconcellos, 2018VASCONCELLOS, E. A. (2018) Urban transport policies in Brazil: the creation of a discriminatory mobility system. Journal of Transport Geography, v. 67, pp. 85-91.). Estima-se que trabalhadores de baixa renda fazem viagens, em média, 20% mais demoradas do que os mais ricos, e 19% dos mais pobres gastam diariamente mais de uma hora de viagem contra 11% dos mais ricos, nas principais regiões metropolitanas do País (Pereira e Schwanen, 2013PEREIRA, R. H. M.; SCHWANEN, T. (2013). Tempo de deslocamento casa-trabalho no Brasil (1992-2009): diferenças entre regiões metropolitanas, níveis de renda e sexo. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/313387061_Tempo_de_deslocamento_casa-trabalho_no_Brasil_1992-2009_diferencas_entre_regioes_metropolitanas_niveis_de_renda_e_sexo. Acesso em: 15 jun 2023.
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). Esses tempos menores experienciados pela população de renda alta se dão, sobretudo, pela capacidade financeira de adquirir automóveis próprios, simultaneamente à de poder escolher uma melhor localização residencial, geralmente próxima de centralidades urbanas onde a maioria dos destinos de interesse – as “oportunidades” – estão concentrados (Guimarães e Lucas, 2019GUIMARÃES, T.; LUCAS, K. (2019). O papel da equidade no planejamento de transporte coletivo urbano no Brasil. Transportes, v. 27, n. 4, pp. 76-92.; Pereira et al., 2019PEREIRA, R. H. M. et al. (2019). Desigualdades socioespaciais de acesso a oportunidades nas cidades brasileiras. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/acessooportunidades/publication/2019_td2535_aop_primeiro/. Acesso em: 7 dez 2022.
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).

Após o começo das operações das companhias e o estabelecimento na maioria das médias e grandes cidades do País houve um período de fortes contestações por parte das prefeituras (em muitos casos incentivadas por movimentos de taxistas e de empresas operadoras de transporte público), buscando regulamentar ou até mesmo proibir a operação das empresas. Embora algumas dessas regras tenham entrado em vigor, foram poucos os casos em que as empresas efetivamente pararam de operar, principalmente devido a decisões judiciais e ao forte lobby praticado pelas companhias (Pasqual e Petzhold, 2018PASQUAL, F. M.; PETZHOLD, G. S. (2018). Panorama das regulamentações de serviços de viagem sob demanda no Brasil. In: CONGRESSO DE PESQUISA E ENSINO EM TRANSPORTE DA ANPET, 32. Gramado/RS. Anais. Rio de Janeiro, Associação Nacional de Pesquisa e Ensino em Transportes.).

A lei federal n. 13.640, de 2018, que regulamenta o transporte remunerado privado individual de passageiros, foi um marco para a consolidação do serviço no País, pois eximiu o governo federal de responsabilidade e estabeleceu que cabe aos municípios regulamentar e fiscalizar o serviço (Brasil, 2018BRASIL (2018). Lei n. 13.640, de 26 de março. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13640.htm. Acesso em: 15 jun 2023.
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). Assim, houve um período de consolidação em que, via de regra, os serviços tinham a permissão de operar nas cidades com alguns requisitos de licenciamento para as empresas, bem como parâmetros mínimos para os veículos (Pasqual e Petzhold, 2018PASQUAL, F. M.; PETZHOLD, G. S. (2018). Panorama das regulamentações de serviços de viagem sob demanda no Brasil. In: CONGRESSO DE PESQUISA E ENSINO EM TRANSPORTE DA ANPET, 32. Gramado/RS. Anais. Rio de Janeiro, Associação Nacional de Pesquisa e Ensino em Transportes.). Apesar de diversos municípios instituírem o pagamento de uma taxa pelo “uso do viário”, geralmente um valor por quilômetro percorrido, são poucos os lugares onde se sabe que os tributos são efetivamente pagos. São Paulo é um dos casos em que a cobrança é aplicada efetivamente, e em 2019 as companhias pagaram cerca de R$215 milhões ao município (São Paulo, 2019SÃO PAULO (2019). Boletim da Receita em Dezembro/2019. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/fazenda/contaspublicas/index.php?p=27478. Acesso em: 10 ago 2023.
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).

Por outro lado, questões ligadas à situação trabalhista dos motoristas seguem pouco ou nada reguladas (Pasqual e Petzhold, 2018PASQUAL, F. M.; PETZHOLD, G. S. (2018). Panorama das regulamentações de serviços de viagem sob demanda no Brasil. In: CONGRESSO DE PESQUISA E ENSINO EM TRANSPORTE DA ANPET, 32. Gramado/RS. Anais. Rio de Janeiro, Associação Nacional de Pesquisa e Ensino em Transportes.), a ponto de dar origem a um termo específico para se referir a esse modelo de trabalho precarizado e sem proteção social: “uberização” (Franco e Ferraz, 2019FRANCO, D. S.; FERRAZ, D. L. D. S. (2019). Uberização do trabalho e acumulação capitalista. Cadernos EBAPE.BR, v. 17, pp. 844-856.). Nesse regime, o “motorista parceiro” (termo usado pelas empresas para se referir aos motoristas, uma vez que eles não são considerados por elas funcionários e o aplicativo funciona somente como plataforma entre eles e os passageiros) possui flexibilidade para trabalhar por quantas horas e dias quiser, sob uma ideia de “liberdade” que, na prática, pode ser encarada como trabalho informal precarizado, uma vez que os motoristas não têm acesso a direitos ou garantias trabalhistas, independentemente de quantas horas prestem serviço.

Apesar de os aplicativos gerarem um aumento no número de viagens realizadas por carros e, consequentemente, impactos negativos no trânsito e em aspectos ambientais, a expectativa inicial era de que eles seriam capazes de complementar o transporte público e, a longo prazo, diminuir a compra de veículos individuais, pois reduziriam tal necessidade para muitas pessoas, especialmente as da classe média (Diao, Kong e Zhao, 2021).

Também pode-se especular sobre um possível aumento na acessibilidade geral da cidade gerado pelos aplicativos, ao oferecerem uma alternativa de transporte às pessoas que não possuem veículo próprio ou que residem em regiões pouco servidas pelos sistemas de transporte público. Enquanto isso, para as classes médias e altas, eles anunciavam-se como um interessante reforço às suas já boas opções de transporte. Esse panorama poderia levar a um aumento na equidade na mobilidade urbana, ao diminuir o abismo existente entre os níveis de acessibilidade dos pobres e dos ricos.

Os dois conceitos-chave em discussão aqui são, portanto, acessibilidade e equidade. Acessibilidade é um conceito clássico da geografia e da área dos transportes, definida genericamente como a capacidade que as pessoas possuem para alcançar serviços, atividades e bens (Hansen, 1959HANSEN, W. G. (1959). How accessibility shapes land use. Journal of the American Institute of Planners, v. 25, n. 2, pp. 73-76.; Levinson e King, 2020LEVINSON, D.; KING, D. (2020). Transport access manual: a guide for measuring connection between people and places. Disponível em: https://hdl.handle.net/2123/23733. Acesso em: 8 set 2022.
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). Ou seja, acessibilidade é sobre as pessoas conseguirem chegar às "oportunidades" que a cidade oferece – os lugares onde vão realizar atividades e/ou suprir suas necessidades, sejam elas de trabalho, educação, lazer, entre outros (Levinson e King, 2020LEVINSON, D.; KING, D. (2020). Transport access manual: a guide for measuring connection between people and places. Disponível em: https://hdl.handle.net/2123/23733. Acesso em: 8 set 2022.
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).

A acessibilidade é geralmente tratada de modo quantitativo, com modelos e métricas voltados a atribuir valores de acessibilidade para unidades espaciais através de diferentes componentes. Enquanto isso, a equidade é um conceito multidimensional de caráter mais abstrato e subjetivo que é interpretado diferentemente por distintas disciplinas sociais e inclui, necessariamente, entendimentos sobre justiça.

Recentemente, os estudos sobre acessibilidade urbana têm evoluído no sentido de incorporar discussões sobre equidade e justiça, procurando avaliar a desigualdade entre áreas e grupos sociais, sob o pressuposto de que quanto maior esse desequilíbrio na acessibilidade, menor a equidade na cidade (Pereira, Schwanen e Banister, 2017; Guimarães e Lucas, 2019GUIMARÃES, T.; LUCAS, K. (2019). O papel da equidade no planejamento de transporte coletivo urbano no Brasil. Transportes, v. 27, n. 4, pp. 76-92.).

A abordagem que vem se consolidando nos estudos de transporte é baseada no princípio de justice as fairness, popularizado por John Rawls em seu trabalho da década de 1970 sobre justiça distributiva e equidade, que parte do princípio de que fatores fora do alcance, não escolhidos, não discricionários – como ter nascido em uma família pobre ou de uma minoria étnico-racial –, não deveriam influenciar nas chances e oportunidades da vida de uma pessoa. Logo, diante de questões como distribuição de bens sociais, os indivíduos não deveriam ser tratados de forma igual, pois são desiguais cultural, econômica e socialmente (Rawls, 1992RAWLS, J. (1992). Justiça como equidade: uma concepção política, não metafísica. Lua Nova: Revista de Cultura e Política, v. 25, pp. 25-59.).

Segundo essa abordagem, o potencial aumento nos níveis específicos de acessibilidade da população menos favorecida gerado pelos aplicativos deveria ser maior do que o das demais classes, contribuindo, assim, para a diminuição das diferenças entre pobres e ricos em termos de acesso à cidade e, consequentemente, para o aumento da equidade urbana.

Porém, na realidade, o alto custo dos aplicativos, quando utilizados com frequência, aliado à incerteza gerada pelas “tarifas dinâmicas” (método utilizado pelas companhias para, em tese, equilibrar oferta e demanda e explorar os horários de pico e de maior necessidade, como em dias chuvosos) faz com que esse aumento de acessibilidade para a população de baixa renda se torne questionável. Além disso, a exclusão deliberada de determinadas regiões das cidades também levanta questionamentos acerca do caráter inclusivo desse serviço (Young e Farber, 2019YOUNG, M.; FARBER, S. (2019). Ride-hailing platforms are shaping the future of mobility, but for whom? Disponível em: https://osf.io/pz7fk/. Acesso em: 8 set 2022.
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; Furtado et al., 2020FURTADO, D. B. S. et al. (2020). Iniciativas sociais na superação da crise de mobilidade urbana em áreas segregadas: o caso da Jaubra na Brasilândia, São Paulo, Brasil. Humanidades & Inovação, v. 7, n. 5, pp. 52-67.).

A relação entre uso de aplicativos e características dos bairros é um aspecto bem consolidado na bibliografia recente que inclui preocupações com equidade, especialmente a publicada na América do Norte, que indica que, em geral, o uso mais intenso desse modo se dá em regiões de alta densidade, mais bem servidas pelo transporte público e com população residente com renda mais alta (Baker, 2020BAKER, D. M. (2020). Transportation Network Companies (TNCs) and public transit: examining relationships between TNCs, transit ridership, and neighborhood qualities in San Francisco. Case Studies on Transport Policy, v. 8, n. 4, pp. 1233-1246.; Barajas e Brown, 2021BARAJAS, J. M.; BROWN, A. (2021). Not minding the gap: does ride-hailing serve transit deserts? Journal of Transport Geography, v. 90.; Jiao e Wang, 2021JIAO, J.; WANG, F. (2021). Shared mobility and transit-dependent population: a new equity opportunity or issue? International Journal of Sustainable Transportation, v. 15, n. 4, pp. 294-305.).

Explorando especificamente a relação dos aplicativos com o transporte público, Cats et al. (2022)CATS, O. et al. (2022). Beyond the dichotomy: how ride-hailing competes with and complements public transport. PLOS ONE, v. 17, n. 1. utilizaram dados de seis cidades estadunidenses e europeias e encontraram que a vasta maioria das viagens tinham uma alternativa viável de transporte público, enquanto 20% a 40% não tinham.

Ainda, o trabalho de Oliveira Souza et al. (2021)DE OLIVEIRA SOUZA, C. et al. (2021). Analysis of job accessibility promoted by ride hailing services: a proposed method. Journal of Transport Geography, v. 93. relacionou os aplicativos às desigualdades de acessibilidade e comparou o acesso a empregos formais gerado pelos aplicativos com o transporte público no Rio de Janeiro. Os resultados apontam que a acessibilidade a empregos é maior por aplicativo somente em regiões com alto número de empregos e nos casos em que dois ou mais passageiros compartilham a viagem, devido ao custo monetário das viagens (ibid.).

Nosso estudo procura se filiar a essa avenida de pesquisa, abordando os efeitos dos aplicativos sobre a acessibilidade e seus reflexos para a equidade na mobilidade urbana. Através de um estudo de caso na cidade de Porto Alegre, Brasil (cidade pioneira na qualificação do transporte público por ônibus e inovadora em serviços alternativos e mobilidade ativa entre as décadas de 1970 e 2000), comparamos a acessibilidade baseada em tempo e custo a diferentes oportunidades da cidade provida pelos aplicativos e pelo transporte público e, através do uso de índices de desigualdade, aferimos seu impacto diferencial para distintos estratos socioeconômicos.

Metodologia

Trata-se de um estudo baseado em dados secundários e em abordagem quantitativa, utilizando modelagem de viagens em Sistema de Informação Geográfica (SIG) apoiada por scripts de programação em linguagem R da ferramenta de roteamento de viagens multimodal r5r, que consiste em um pacote para roteamento de código aberto desenvolvido em Java para a linguagem R baseado na ferramenta R5, desenvolvida pela Conveyal (Conway, Byrd e Van Eggermond, 2018; Conway e Stewart, 2019CONWAY, M. W.; STEWART, A. F. (2019). Getting Charlie off the MTA: a multiobjective optimization method to account for cost constraints in public transit accessibility metrics. International Journal of Geographical Information Science, v. 33, n. 9, pp. 1759-1787.; Pereira et al., 2021PEREIRA, R. H. M. et al. (2021). r5r: Rapid Realistic Routing on Multimodal Transport Networks with R 5 in R. Transport Findings. Disponível em: https://findingspress.org/article/21262-r5r-rapid-realistic-routing-on-multimodal-transport-networks-with-r-5-in-r. Acesso em: 23 ago 2023.
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).

A unidade de análise são células hexagonais com diagonal de 357 metros que compõem a malha H3, desenvolvida originalmente pela Uber (Pereira et al., 2021PEREIRA, R. H. M. et al. (2021). r5r: Rapid Realistic Routing on Multimodal Transport Networks with R 5 in R. Transport Findings. Disponível em: https://findingspress.org/article/21262-r5r-rapid-realistic-routing-on-multimodal-transport-networks-with-r-5-in-r. Acesso em: 23 ago 2023.
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). A malha de Porto Alegre cobre toda a área do município e totaliza 6.114 células únicas.

A avaliação da desigualdade é feita através da aplicação de uma adaptação da medida de Palma, que consiste em calcular a razão entre a acessibilidade dos 10% mais ricos e a dos 40% mais pobres.

Dados de origem e destino

Os dados populacionais e socioeconômicos de Porto Alegre foram buscados no Projeto "Acesso a Oportunidades", que disponibiliza gratuitamente dados do Censo de 2010 de 27 cidades do País reagregados nas respectivas malhas hexagonais. A renda domiciliar média da população, classificada em quintis e decis, foi o dado utilizado para caracterizar a população residente no hexágono, cujos centroides são os pontos de origem para os cálculos de acessibilidade.

Os destinos são as oportunidades urbanas, os locais onde ocorrem atividades associadas a trabalho, educação, compras, saúde e lazer – os motivos de viagem associados ao maior número de deslocamentos em Porto Alegre (Empresa Pública de Transporte e Circulação, 2004EPTC - EMPRESA PÚBLICA DE TRANSPORTE E CIRCULAÇÃO (2004). Pesquisa de origem e destino de Porto Alegre. Disponível em: http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/eptc/usu_doc/relatorio_edom_2003.pdf. Acesso em: 15 jun 2023.
http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/pref...
). Trabalho e educação geram deslocamentos utilitários ou mandatórios, enquanto os demais motivos demandam deslocamentos complementares ou acessórios.

Os dados referentes à localização de postos de empregos formais foram obtidos a partir da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) do Ministério do Trabalho e Previdência do ano de 2020 (Brasil, 2020BRASIL (2020). Rais 2020. Disponível em: https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/assuntos/estatisticas-trabalho/rais/rais-2020. Acesso em: 29 jun 2021.
https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt...
), enquanto os locais com as oportunidades de educação (universidades), saúde (hospitais), compras (shopping centers e grandes supermercados) e lazer (parques públicos) tiveram suas coordenadas obtidas a partir de bases de dados do município de Porto Alegre1 1 Ver: https://www.google.com/maps/d/viewer?mid=1bx99VwelBTJwSqTBM7AP8U8A3FbXryg≪=-30.05542457741573%2C-51.14057907185402&z=10 e https://abrasce.com.br/guia-de-shoppings/?state=RS&city=Porto+Alegre&letter=. ou de entidades ligadas a cada setor.2 2 Ver: https://abrasce.com.br/guia-de-shoppings/?state=RS&city=Porto+Alegre&letter= e https://atlassocioeconomico.rs.gov.br/educacao-superior.

A posição no espaço da cidade desses locais foi georreferenciada e atribuída ao hexágono no interior do qual se localiza.

Dados de transporte

A pesquisa foi realizada considerando deslocamentos por transporte público por ônibus (Porto Alegre não possui sistema de metrô intraurbano) e por aplicativos – companhias Uber3 3 https://www.uber.com/br/pt-br/. e 994 4 https://99app.com/. que dominam 95% do mercado brasileiro (Carneiro, 2019CARNEIRO, I. G. (2019). Uber perde mercado para app 99, mas continua líder absoluto entre apps. Disponível em: https://www.tecmundo.com.br/mercado/146526-uber-perde-mercado-app-99-continua-lider-absoluto-entre-apps.htm. Acesso em: 19 dez 2022.
https://www.tecmundo.com.br/mercado/1465...
). Os dados relativos à operação do transporte público foram obtidos da Prefeitura Municipal no formato GTFS (General Transit Feed Specification) que contém a localização dos pontos de parada, a trajetória das linhas e a frequência das viagens, e são referentes a um dia útil de operação em maio de 2019.5 5 Ver: http://datapoa.com.br/dataset/gtfs. Essa opção foi feita para refletir um cenário pré-pandemia de covid-19 (2020-2022), quando a operação do transporte público foi largamente afetada e ainda estava em patamares fora da normalidade durante o desenvolvimento deste estudo.

Medida de acessibilidade

O conceito de acessibilidade no planejamento urbano remonta à década de 1950, quando foi definida no trabalho pioneiro de Hansen como “o potencial de oportunidades para interação”, sendo “uma medida da distribuição espacial de atividades a partir de um ponto” (Hansen, 1959, p. 73; tradução nossa). A definição de Hansen pode ser expressa pela Equação 1, conhecida como “equação de Hansen” (Levinson e King, 2020LEVINSON, D.; KING, D. (2020). Transport access manual: a guide for measuring connection between people and places. Disponível em: https://hdl.handle.net/2123/23733. Acesso em: 8 set 2022.
https://hdl.handle.net/2123/23733...
):

A i = i O j f ( C i j ) (1)

Onde:

Ai = acessibilidade a partir do local i;

Oj = número de oportunidades disponíveis no destino j;

f(Cij) = função de impedância / custo da viagem de i à j;

O resultado são “oportunidades cumulativas” – o número de destinos que podem ser acessados em um intervalo de tempo, de distância ou custo monetário (Geurs e van Wee, 2004GEURS, K. T.; VAN WEE, B. (2004). Accessibility evaluation of land-use and transport strategies: review and research directions. Journal of Transport Geography, v. 12, n. 2, pp. 127-140.; Levinson e King, 2020LEVINSON, D.; KING, D. (2020). Transport access manual: a guide for measuring connection between people and places. Disponível em: https://hdl.handle.net/2123/23733. Acesso em: 8 set 2022.
https://hdl.handle.net/2123/23733...
).

As vantagens dessa medida são que ela requer relativamente poucos dados e é de fácil comunicação para não especialistas, além de permitir comparações entre tempos e locais (Levinson e King, 2020LEVINSON, D.; KING, D. (2020). Transport access manual: a guide for measuring connection between people and places. Disponível em: https://hdl.handle.net/2123/23733. Acesso em: 8 set 2022.
https://hdl.handle.net/2123/23733...
). Entre as desvantagens estão a arbitrariedade da escolha do intervalo de tempo de viagem máximo, a não consideração de efeitos de competição (restrições da oferta interna das oportunidades, como vagas de emprego e em escolas e leitos de hospitais, por exemplo) e a não consideração de fatores individuais e subjetivos, como a preferência das pessoas (Geurs e van Wee, 2004GEURS, K. T.; VAN WEE, B. (2004). Accessibility evaluation of land-use and transport strategies: review and research directions. Journal of Transport Geography, v. 12, n. 2, pp. 127-140.; Levinson e King, 2020LEVINSON, D.; KING, D. (2020). Transport access manual: a guide for measuring connection between people and places. Disponível em: https://hdl.handle.net/2123/23733. Acesso em: 8 set 2022.
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).

A medida aqui utilizada é uma adaptação da medida de oportunidades cumulativas criada para incorporar o custo monetário das viagens, bem como a capacidade das pessoas de pagarem pela viagem a partir da localização de sua residência. Ela foi denominada de acessibilidade baseada em tempo e custo.

Para as viagens por transporte público, o preço considerado foi o da tarifa de ônibus urbano de Porto Alegre em maio de 2019: R$4,55. Já para os aplicativos foram usadas médias simples das estimativas fornecidas pelas plataformas Uber e 99, apresentadas nas Equações 2 e 3:

T ( uber) = 2 , 01 + 0 , 36 t ( m i n ) + 1 , 12 d ( k m ) R $ 5 , 60 (2)
T ( 99 ) = 2 , 50 + 0 , 15 t ( m i n ) + 2 , 20 d ( k m ) R $ 8 , 15 (3)

Para simplificar os cálculos visando a concisão do artigo, a "tarifa dinâmica", mecanismo existente em ambos os aplicativos como estratégia de adaptação dos preços que visa maximizar os ganhos em horário de pico ou grande concorrência pelo serviço, não foi considerada neste estudo, fazendo com que os valores considerados possam ser diferentes – em geral, subestimados – em algumas ocasiões.

O cômputo das acessibilidades cumulativas inicia-se pelo cálculo da viabilidade de uma viagem, que depende de dois fatores: o primeiro é o número médio de viagens realizadas para cada motivo de viagem em um mês, baseado nos padrões de mobilidade da população local. Segundo o relatório da última Pesquisa Origem e Destino de Porto Alegre, uma pessoa móvel realiza, em média, 2,4 viagens por dia, totalizando aproximadamente 53 viagens por mês (EPTC, 2004EPTC - EMPRESA PÚBLICA DE TRANSPORTE E CIRCULAÇÃO (2004). Pesquisa de origem e destino de Porto Alegre. Disponível em: http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/eptc/usu_doc/relatorio_edom_2003.pdf. Acesso em: 15 jun 2023.
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).

O Quadro 1 apresenta a repartição desse total de viagens por diferentes motivos, que foi estimada com base em duas fontes: a pesquisa de Origem e Destino (OD) de Porto Alegre (EPTC, 2004EPTC - EMPRESA PÚBLICA DE TRANSPORTE E CIRCULAÇÃO (2004). Pesquisa de origem e destino de Porto Alegre. Disponível em: http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/eptc/usu_doc/relatorio_edom_2003.pdf. Acesso em: 15 jun 2023.
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) e a pesquisa nacional "Mobilidade da População Urbana" (CNT e NTU, 2017).

Quadro 1
– Número de viagens por mês por motivo de viagem

O segundo fator de viabilidade é a limitação de despesas com transporte a 20% da renda média per capita mensal da região de origem, sendo este um valor aproximado da média do percentual do orçamento familiar que é gasto com deslocamentos segundo a última Pesquisa de Orçamentos Familiares (IBGE, 2021IBGE (2021). POF - Pesquisa de Orçamentos Familiares 2017-2018. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/saude/24786-pesquisa-de-orcamentos-familiares-2.html. Acesso em: 8 set 2022.
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). Se o valor total mensal a ser gasto com os deslocamentos mensais for inferior à restrição de renda do hexágono/região de origem, o preço será considerado viável e a oportunidade, acessível.

Uma vez que os valores de renda média disponíveis por hexágono/localização são oriundos do Censo de 2010 e não existem dados de rendimento recentes em um nível tão desagregado, fizemos uma atualização nos valores baseada na trajetória do salário-mínimo entre 2010 e 2019.

Existem inúmeras maneiras de alocar o orçamento pessoal ou familiar dedicado ao transporte, escolhendo e variando a quantidade de viagens por modo e motivo de forma a refletir os diferentes comportamentos e perfis de mobilidade. Por razões de concisão, optamos por apresentar, aqui, apenas duas alternativas “extremas”: uma em que a limitação orçamentária de 20% é dedicada totalmente a viagens “utilitárias” (aquelas realizadas diariamente e que são mandatórias, dirigindo-se aos “centros de emprego” e às “universidades”) e outra na qual esse percentual é dedicado somente às “complementares” (aquelas de caráter acessório e que não precisam ser realizadas todos os dias, dirigindo-se a “hospitais”, “parques” e “compras”).

As Tabelas 1 e 2 apresentam os números de viagens por mês para os dois casos explorados.

Tabela 1
– Número de viagens por mês e o percentual da renda dedicado das viagens “utilitárias”

Tabela 2
– Número de viagens por mês e percentual da renda dedicado das viagens “complementares”

Medida de desigualdade

Medidas de desigualdade são abordagens que buscam avaliar o quão (des)igual é um conjunto de valores (associados a pessoas, grupos de pessoas, regiões, etc.). Entre as mais utilizadas em transporte estão o índice de Gini (a mais popular) e a medida de Palma que recentemente vem se tornando usual.

A medida de Palma consiste na razão do valor (originalmente, a própria renda) dos 10% mais ricos sobre o valor dos 40% mais pobres (Palma, 2011). Porém, ela pode ser adaptada ao substituir a renda pelos valores/graus de acessibilidade (Guzman e Oviedo, 2018GUZMAN, L. A.; OVIEDO, D. (2018). Accessibility, affordability and equity: assessing "pro-poor" public transport subsidies in Bogotá. Transport Policy, v. 68, pp. 37-51.; Pereira et al., 2019PEREIRA, R. H. M. et al. (2019). Desigualdades socioespaciais de acesso a oportunidades nas cidades brasileiras. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/acessooportunidades/publication/2019_td2535_aop_primeiro/. Acesso em: 7 dez 2022.
https://www.ipea.gov.br/acessooportunida...
; Herszenhut et al., 2022HERSZENHUT, D. et al. (2022). The impact of transit monetary costs on transport inequality. Journal of Transport Geography, v. 99.). Logo, quanto maior a razão, maior é a disparidade de acessibilidade entre os estratos socioeconômicos da população, o que representa um cenário de menos equidade. A vantagem da medida de Palma, quando comparada ao índice de Gini, é a incorporação da renda dos grupos, não tratando todos os valores como sendo de indivíduos iguais (Guzman e Oviedo, 2018GUZMAN, L. A.; OVIEDO, D. (2018). Accessibility, affordability and equity: assessing "pro-poor" public transport subsidies in Bogotá. Transport Policy, v. 68, pp. 37-51.; Herszenhut et al., 2022HERSZENHUT, D. et al. (2022). The impact of transit monetary costs on transport inequality. Journal of Transport Geography, v. 99.). Ou seja, ela permite comparar a diferença da acessibilidade entre os mais ricos e os mais pobres de forma mais direta.

A medida pode ser calculada conforme a Equação 4 (Palma, 2011PALMA, J. G. (2011). Homogeneous middles vs. heterogeneous tails, and the end of the 'inverted-u': it's all about the share of the rich: it's all about the share of the rich. Development and Change, v. 42, n. 1, pp. 87-153.):

P = A 10 A 40

Onde:

P = Razão de Palma

A10 = Acessibilidade média do grupo dos 10% com maior renda

A40 = Acessibilidade média do grupo dos 40% de menor renda.

Resultados e discussão

Caracterização da área de estudo

Porto Alegre é uma cidade da região Sul do Brasil, capital do seu estado (Rio Grande do Sul) e que possui população próxima a 1,3 milhão de habitantes em uma área de quase 500 km2, sendo o décimo município mais populoso do País (IBGE, 2023IBGE (2023). Cidades e estados - Porto Alegre. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/rs/porto-alegre.html. Acesso em: 19 dez 2023.
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). O crescimento da cidade deu-se a partir da região onde hoje se encontra o chamado Centro Histórico, uma península na margem leste do lago Guaíba. Em linhas gerais, a cidade segue uma estrutura urbana radial, com os principais eixos de transporte saindo do centro para as demais regiões a leste, norte e sul.

As maiores densidades populacionais encontram-se, sobretudo, no entorno desses eixos e na região nordeste. A zona sul, ao contrário, abriga principalmente áreas residenciais e de baixas densidades, incluindo uma considerável área rural. As regiões de rendas mais altas localizam-se, principalmente, a leste do Centro Histórico, distantes entre dois e cinco quilômetros, e em alguns bairros majoritariamente residenciais e de baixa densidade no sul. Já as regiões mais pobres são majoritariamente distantes do Centro, estando localizadas nos limites do município, na região das Ilhas (a Norte do Centro Histórico) e também na Zona Leste (a distâncias maiores da região central).

A Figura 1 apresenta mapas com as densidades populacionais e a renda média per capita, classificada em decis com as principais avenidas destacadas.

Figura 1
– Densidade populacional (esquerda) e decis de renda (direita) em Porto Alegre (maior = cor mais escura)

Vemos que as altas densidades são mais espalhadas do que as altas rendas que se apresentam concentradas em basicamente dois núcleos, um central e outro ao sul, nas localizações menos centrais, mas mais aprazíveis, pela proximidade com a borda do Rio Guaíba. A conclusão, intuitiva e coerente com a realidade das cidades do Brasil, é que existem grandes concentrações populacionais de baixa renda nas periferias, as quais vão demandar viagens até as zonas de oportunidade centrais, especialmente os empregos.

A divisão modal no município é de 21% para deslocamentos a pé, 1% por bicicletas, 40% por transporte público e 36% por transporte individual e táxi (Empresa Pública de Transporte e Circulação, 2004EPTC - EMPRESA PÚBLICA DE TRANSPORTE E CIRCULAÇÃO (2004). Pesquisa de origem e destino de Porto Alegre. Disponível em: http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/eptc/usu_doc/relatorio_edom_2003.pdf. Acesso em: 15 jun 2023.
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). A frota de veículos por habitante está em crescimento – em maio de 2023 era de 0,68 veículos por habitante, contra 0,55 em 2017 (Denatran, 2023DENATRAN (2023). Frota de veículos, por tipo e com placa, segundo os municípios da Federação - maio/2023. Disponível em: https://bit.ly/47ybj9t. Acesso em: 14 ago 2023.
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). Tal evolução indica que o percentual de deslocamentos por veículos individuais deve ser ainda maior, dado a diferença entre os anos dos dados. Em 2010, o tempo médio de deslocamento casa-trabalho em toda a Região Metropolitana (RM) era de 27,7 minutos – o menor entre as 10 RMs brasileiras selecionadas (Pereira e Schwanen, 2013PEREIRA, R. H. M.; SCHWANEN, T. (2013). Tempo de deslocamento casa-trabalho no Brasil (1992-2009): diferenças entre regiões metropolitanas, níveis de renda e sexo. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/313387061_Tempo_de_deslocamento_casa-trabalho_no_Brasil_1992-2009_diferencas_entre_regioes_metropolitanas_niveis_de_renda_e_sexo. Acesso em: 15 jun 2023.
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).

A cidade tem uma relevância histórica no cenário nacional da mobilidade urbana. O sistema de transporte público da cidade conta com uma linha de metrô de superfície que liga o Centro Histórico à Zona Norte e a alguns dos municípios da Região Metropolitana; bem como uma vasta rede de corredores segregados e faixas exclusivas para ônibus. Estas últimas infraestruturas foram inovações implementadas ainda na década de 1970, estruturando o sistema a partir das principais avenidas radiais. Na década de 1990, prefeitos do Partido dos Trabalhadores (PT) fizeram o audacioso movimento de assumir o controle das empresas de ônibus locais para a propriedade pública, culminando com a premiação da empresa de ônibus municipal (Carris) como a melhor do Brasil por vários anos consecutivos. Tal cenário se desenvolveu até 2004, quando partidos conservadores retornaram à prefeitura e iniciaram um período de políticas neoliberais que incluem até mesmo a previsão de privatização da Carris.

Porto Alegre também foi pioneira na construção de ciclovias nas grandes cidades brasileiras, contando com um Plano Diretor Cicloviário de 2009, outra inovação nacional que propôs mais de 400 km de infraestrutura cicloviária, dos quais 77 km haviam sido implementados até o começo de 2023.

A Figura 2 apresenta a localização de todas as oportunidades urbanas consideradas na pesquisa.

Figura 2
– Distribuição espacial das oportunidades em Porto Alegre. Esquerda: pontos georreferenciados: universidades em azul, compras em preto, hospitais em vermelho e parques em verde. Direita: graduação da quantidade de vínculos empregatícios nas células (vermelho = mais, verde = menos)

De forma geral, a distribuição das oportunidades é bastante concentrada, com a maioria das unidades nas proximidades da região central (e de maior renda média) e um número menor mais disperso, mas quase sempre próximos às principais avenidas arteriais. Embora tenha o maior número de unidades e apareça em diferentes regiões, as oportunidades de compras são as mais concentradas, junto dos destinos de empregos. Os parques são, em média, as unidades mais dispersas, pois, ao contrário dos estabelecimentos implantados segundo lógicas de mercado, eles são produto de normas de planejamento urbano que exigem o suprimento de áreas verdes em todas as novas urbanizações (Porto Alegre, 1999PORTO ALEGRE (1999). Lei complementar n. 434, de 1º de dezembro. Dispõe sobre o desenvolvimento urbano no Município de Porto Alegre, institui o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental de Porto Alegre e dá outras providências. Disponível em: http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/edificapoa/usu_doc/pddua180113.pdf. Acesso em: 12 out 2022.
http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/pref...
).

Análise de acessibilidade por tempo e custo

Os resultados apresentados são referentes ao número de oportunidades acessíveis a partir de cada hexágono da cidade, para intervalos de 30 e 60 minutos, por transporte público (TP) e aplicativos (apps), para os dois grupos de viagens: “utilitárias” (postos de trabalho e universidades) e “complementares” (hospitais, parques e compras). Os resultados são apresentados em forma de percentuais do número total de oportunidades de cada tipo na cidade.

Deslocamentos utilitários

As Figuras 3 e 4 apresentam mapas com as distribuições de acessibilidade a postos de emprego e universidades por TP e aplicativo para os dois tempos de viagem, destacando o percentual de oportunidades acessíveis a partir de cada hexágono.

Figura 3
– Percentual de oportunidades utilitárias acessíveis por TP em 30 min (acima) e 60 min (abaixo) – à esquerda, percentual para trabalho e, à direita, universidades

Figura 4
– Percentual de oportunidades utilitárias acessíveis por aplicativo em 30 min (acima) e 60 min (abaixo) – à esquerda, percentual para postos de trabalho e, à direita, para universidades

Para o TP, há um claro padrão espacial no qual os valores de acessibilidade crescem para leste a partir do Centro Histórico (CH) e se mantêm em valores altos principalmente no entorno das vias arteriais. Para ambos os grupos de destinos, os valores mais altos estão localizados a leste do CH, justamente onde está a principal região de alta renda da cidade. Tais bairros são mais próximos da maioria das oportunidades do que a região de alta renda da região sul, evidenciando como a centralidade é, como esperado, o fator de "desempate" da acessibilidade entre zonas com o mesmo poder aquisitivo.

Enquanto para o TP há um notável aumento nos valores de acessibilidade no cenário de 60 minutos em relação ao de 30 minutos, os resultados do aplicativo apresentam distribuições quase idênticas para os dois tempos de viagem. Isso acontece pois, para o primeiro modo, a tarifa é sempre a mesma, independentemente da duração da viagem, fazendo com que, naturalmente, em um tempo maior de viagem, mais destinos possam ser acessados. Já para os aplicativos, viagens mais longas acarretam preços maiores, fazendo com que muitas delas não sejam viáveis financeiramente para a população de menor renda, enquanto a população de maior renda (que, como visto, vive majoritariamente mais próxima das oportunidades) já alcança um número bastante elevado de destinos no intervalo de 30 minutos, não havendo diferença significativa para os de 60 minutos.

Também foram calculados os valores médios de acessibilidade para cada decil de renda, apresentados nos gráficos na Figura 5.

Figura 5
– Percentual médio de oportunidades utilitárias acessíveis por TP e aplicativo por decil de renda

Enquanto para o TP a diferença entre as médias dos decis de renda não é tão grande e tem um comportamento aproximadamente linear, para os aplicativos a curva tem formato próximo ao exponencial, "acelerando" fortemente a partir do sexto decil. As razões entre o décimo decil e o primeiro com média superior a zero são de 25,20 e 17,08 para o TP e de 5.540 e 1.130 para o aplicativo com destino a empregos e universidades, respectivamente.

Para ambos os modos, o primeiro decil de renda possui média de acessibilidade praticamente nula para ambos os motivos, explicitando a existência de alta desigualdade espacial e financeira e até mesmo total exclusão. A grande desigualdade nesse cenário é comprovada pelo cálculo das medidas de Palma das diferentes distribuições de acessibilidade, apresentados na Figura 6.

Figura 6
– Razões de Palma das distribuições de acessibilidade das viagens utilitárias

Enquanto, no TP, a desigualdade é maior no intervalo menor (30 minutos), no aplicativo se observa o contrário, e com grandezas muito maiores. As desigualdades determinadas pelos aplicativos, nesse caso, são muito acentuadas, com valores de Palma superiores a 15.000 para empregos e incalculáveis para as universidades, uma vez que a acessibilidade baseada em tempo e custo para os 40% mais pobres é igual a zero (exclusão), ou seja, a medida de Palma, tende ao infinito (apesar da distribuição espacial da acessibilidade ser muito similar para os dois intervalos de tempo).

Deslocamentos complementares

As Figuras 7 e 8 apresentam as distribuições de acessibilidade por TP e aplicativos para deslocamentos com destino a hospitais, parques e compras em 30 e 60 minutos.

Figura 7
– Percentual de oportunidades complementares acessíveis por TP em 30 minutos (acima) e 60 minutos (abaixo) – da esquerda para a direita, hospitais, parques e compras

Figura 8
– Percentual de oportunidades complementares acessíveis por aplicativo em 30 minutos (acima) e 60 minutos (abaixo) – da esquerda para a direita, hospitais, parques e compras

Novamente, a diferença entre os diferentes tempos é mais visível para o TP do que para o aplicativo, pelos mesmos motivos. Contudo, aqui é possível visualizar ganhos generalizados de acessibilidade por aplicativo, em regiões de diferentes perfis, dos 30 minutos para os 60 minutos, o que se deve à maior dispersão das oportunidades discricionárias no território em comparação às utilitárias. Também foram calculados os valores médios de acessibilidade por decil de renda, apresentados na Figura 9.

Figura 9
– Percentual médio de oportunidades complementares acessíveis por TP e por aplicativo em 30 minutos e 60 minutos, por decil de renda

Mais uma vez, observam-se valores mais elevados nos deslocamentos por aplicativo, porém, nesse caso, as curvas têm formato aproximadamente sigmoide, com o percentual de oportunidades acessíveis aumentando fortemente entre o terceiro e o sétimo decil e, a seguir, acomodando-se próximo ao limite máximo. Esse parâmetro – o limite superior – também traz conclusões relevantes à discussão: pouco abaixo de 25% para TP (30 minutos), cerca de 80% para TP (60 minutos), próximo a 90% para aplicativo (30 minutos) e próximo a 100% para aplicativo (60 minutos), ratificando a alta pervasividade do automóvel e a limitação intrínseca ao serviço de ônibus.

Enquanto os parques são o motivo de viagem com menores valores de acessibilidade por TP, para aplicativos são os destinos de compras, evidenciando a baixa acessibilidade às áreas verdes fornecida pelo transporte público de Porto Alegre, sobretudo para grupos de menor renda.

Para o TP, as razões das médias de acessibilidade entre os decis extremos (décimo/ primeiro) para hospitais, parques e compras respectivamente são em torno de 17, 20 e 14. Ou seja, são de grandezas similares às viagens obrigatórias, o que indica que a desigualdade entre viagens utilitárias e complementares é similar quando se trata de transporte público. Já para os aplicativos, as razões das médias de acessibilidade entre os decis extremos, embora bastante acentuadas (251, 101 e 60, aproximadamente), são consideravelmente menores do que aquelas encontradas para os aplicativos nas viagens utilitárias (superiores a 1.000). Dada a maior frequência das viagens utilitárias, tais resultados eram esperados. Porém, as diferenças entre os valores impressionam e comprovam um cenário de muita desigualdade no acesso.

Os valores das medidas de Palma para os deslocamentos complementares estão apresentados na Figura 10.

Figura 10
– Medidas de Palma das distribuições de acessibilidade das viagens complementares

Como era esperado, os índices apresentam diminuições importantes quando comparados aos dos deslocamentos utilitários, principalmente para o aplicativo. No caso presente, eles já podem ser apresentados na mesma escala (eixo y dos gráficos) dos valores de TP e, ao contrário destes que diminuem com o aumento do intervalo de tempo, apresentam comportamento crescente com o aumento no tempo, em convergência aos resultados encontrados por Herszenhut et al. (2022)HERSZENHUT, D. et al. (2022). The impact of transit monetary costs on transport inequality. Journal of Transport Geography, v. 99.. As desigualdades menores podem ser explicadas, principalmente, pelo número reduzido de deslocamentos em comparação às viagens utilitárias.

Enquanto os resultados encontrados por de Oliveira Souza (2021)DE OLIVEIRA SOUZA, C. et al. (2021). Analysis of job accessibility promoted by ride hailing services: a proposed method. Journal of Transport Geography, v. 93. mostram que, em regiões com grande número de empregos e atividade comercial, a acessibilidade a empregos gerada pelos aplicativos é superior à gerada pelo TP para viagens com mais de dois passageiros, nosso estudo aponta que, para viagens com destino a empregos, isso depende do tempo de viagem: para deslocamentos de até 30 minutos os resultados são similares e as regiões de maior atividade (e mais ricas) possuem acessibilidade superior por aplicativo do que por TP. Porém, para 60 minutos, o cenário inverte-se, e a acessibilidade por TP é maior em todas as regiões. Isso se dá principalmente pelo custo monetário que é fixo para viagens de ônibus e variável pelo aplicativo, não sendo viável para a maioria da população em deslocamentos longos. Ao contrário do citado estudo, nossa pesquisa considerou, por um lado, somente viagens realizadas por um passageiro, sem possibilidade de divisão do custo, e, por outro, incorporou viagens por outros motivos.

Conclusões

O surgimento dos aplicativos de transporte no Brasil levantou preocupações a respeito dos seus impactos no trânsito e na sustentabilidade ambiental, contudo, também, apresentou-se como uma alternativa que poderia servir a regiões periféricas pouco atendidas pelo transporte público, complementando os serviços coletivos e, potencialmente, levando a um aumento na acessibilidade de grupos menos favorecidos e, consequentemente, à maior equidade no transporte urbano. Porém, o custo monetário das viagens – a tarifa – como era esperado, tende a funcionar como uma barreira para o seu uso frequente para essa parcela da população.

Buscando aprofundar esse entendimento, nosso estudo quantificou a acessibilidade fornecida pelos aplicativos de transporte – medida como "oportunidades cumulativas" – e a comparou com a acessibilidade por transporte público na cidade de Porto Alegre. A tarifa foi considerada como um dos componentes da “acessibilidade baseada em tempo e custo” juntamente ao tempo de deslocamento. A renda média de cada região do município, o limite do orçamento dedicado ao transporte e o número de viagens por mês por cada motivo – separados entre "utilitários" e "complementares" – foram considerados para verificar se o sistema ride-hailing é uma opção de transporte viável para a realização de deslocamentos até os principais destinos da cidade. Medidas de desigualdade de Palma foram calculadas sobre as distribuições de acessibilidade resultantes para avaliar o impacto dos aplicativos sobre o quadro de equidade social da cidade.

Os resultados apontam que as regiões centrais e de renda alta apresentam níveis de acessibilidade em média bastante superiores aos das regiões periféricas e pobres, o que é condizente com os resultados de estudos similares conduzidos recentemente em outras cidades brasileiras (Bittencourt, Giannotti e Marques, 2021; Pereira et al., 2019PEREIRA, R. H. M. et al. (2019). Desigualdades socioespaciais de acesso a oportunidades nas cidades brasileiras. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/acessooportunidades/publication/2019_td2535_aop_primeiro/. Acesso em: 7 dez 2022.
https://www.ipea.gov.br/acessooportunida...
; Slovic et al., 2019SLOVIC, A. D. et al. (2019) The long road to achieving equity: job accessibility restrictions and overlapping inequalities in the city of São Paulo. Journal of Transport Geography, v. 78, pp. 181-193.). Mostram também que a diferença dos valores de acessibilidade entre aplicativo e transporte público é substancialmente maior para as viagens aos destinos mais frequentes e “compulsórios” – centros de emprego e universidades, especialmente – entre os decis de menor renda, para os quais o valor de repetidas corridas em um mês comprometeriam mais do que a renda disponível para transporte. Para esses deslocamentos, as oportunidades cumulativas da população mais pobre foram nulas ou próximas a isso, com os índices de Palma apontando desigualdades extremamente elevadas em relação à população de mais alta renda. Contudo, para os deslocamentos que possuem caráter mais eventual e menos frequente, as desigualdades são menos acentuadas e esse serviço aparece como uma alternativa viável e que pode ser realizada por uma parcela maior da população, incluindo as de menor renda.

Tais resultados são bastante intuitivos e mostram que, quando se trata dos deslocamentos mais importantes e frequentes, os aplicativos não contribuem para um aumento da equidade no transporte urbano em Porto Alegre, trazendo ainda mais desigualdade à já determinada pelo deficiente transporte público da cidade. Entretanto, esse recente serviço pode servir como uma alternativa de mobilidade urbana para deslocamentos que não acontecem diariamente, principalmente aqueles de curta duração, podendo, por exemplo, aumentar o acesso da população de baixa renda ao lazer ao ar livre e cumprir um papel importante também em deslocamentos noturnos a lazer ou quando o motorista irá consumir bebidas alcoólicas.

As grandes diferenças de acessibilidade observadas entre ricos e pobres e o consequente aumento da desigualdade na mobilidade de Porto Alegre mostram como o direito à cidade e às oportunidades que ela oferece não é garantido a grande parte da população porto-alegrense e, por extensão, brasileira.

Os resultados ajudam a entender melhor os impactos causados pelos serviços de transporte por aplicativo nas cidades e indicam que eles devem ser observados com cautela pelo poder público. Mesmo que não contribuam para maior acessibilidade em deslocamentos frequentes pela população pobre e periférica, eles podem cumprir um papel importante na mobilidade urbana.

As implicações das evidências aqui levantadas para o planejamento e a gestão do transporte urbano em capitais brasileiras incluem a trivial recomendação para tornar o serviço de ônibus mais atraente, confiável e barato, aumentando sua disponibilidade e frequência, sobretudo em regiões de menor renda, em linha com as tendências contemporâneos sobre o financiamento do transporte público que pode levar à adoção do passe livre (Santini, 2019SANTINI, D. (2019). Passe livre: as possibilidades da tarifa zero contra a distopia da uberização. São Paulo, Autonomia Literária.; Gregori et al., 2020GREGORI, L.; WHITAKER, C.; VAROLI, J. J.; ZILBOVICIUS, M.; GREGORI, M. S. (2020). Tarifa zero: a cidade sem catracas. São Paulo, Autonomia Literária.).

Caso a intenção seja fomentar a acessibilidade da população periférica por aplicativo como parte de uma política de multimodalidade, subsídios a esses grupos para viagens a trabalho e estudo – "bolsa-mobilidade" – podem ser criados. Porém, com especial atenção aos impactos negativos do aumento no número de viagens de carro.

Outras políticas que incentivem a complementaridade entre os modos de transporte, como descontos para viagens com destino a terminais de ônibus, por exemplo, podem contribuir para o aumento no acesso à cidade da população segregada. Práticas desse tipo já foram testadas em pilotos em São Paulo e no Rio de Janeiro (Metrô e 99 lançam..., 2017).

Do ponto de vista fiscal, uma política de cobrança de impostos variável, que cobre mais de viagens iniciadas em regiões centrais e menos em regiões periféricas ou que cobre menos de viagens com veículos híbridos ou elétricos, como a sugerida em São Paulo, é alternativa que pode contribuir para o aumento da acessibilidade e mitigar os impactos negativos dos aplicativos ao mesmo tempo (Pasqual e Petzhold, 2018PASQUAL, F. M.; PETZHOLD, G. S. (2018). Panorama das regulamentações de serviços de viagem sob demanda no Brasil. In: CONGRESSO DE PESQUISA E ENSINO EM TRANSPORTE DA ANPET, 32. Gramado/RS. Anais. Rio de Janeiro, Associação Nacional de Pesquisa e Ensino em Transportes.).

As evidências permitem, ainda, a indicação de políticas urbanas que aumentem a acessibilidade urbana através de mudanças no padrão de uso do solo, tanto pelo lado da moradia, com incentivo à habitação social em regiões centrais e próximas às oportunidades, quanto através da oferta mais bem distribuída das atividades urbanas, por meio de, por exemplo, incentivo fiscal para localização de comércios e serviços em determinadas regiões carentes.

Nosso trabalho certamente apresenta algumas limitações: a falta de dados recentes sobre o padrão de mobilidade e as características socioeconômicas da população de Porto Alegre faz com que os resultados não reflitam com precisão a realidade atual, algo que poderá ser mais bem entendido com os resultados do Censo 2022 e da próxima Pesquisa Origem-Destino do município, em elaboração quando da redação deste artigo (Porto Alegre, 2023).

O cálculo das acessibilidades feito para somente um comportamento de mobilidade, sem variações no número de viagens por motivo ou no limite do orçamento a ser gasto com transporte e a não exploração da possibilidade de divisão do custo das corridas por mais de um passageiro (mesmo que exija um grau de organização e racionalidade no planejamento das viagens por parte dos usuários, o que é pouco comum em nossa sociedade) podem fazer com que o panorama de desigualdade seja sensivelmente diferente da "realidade lá fora". Também a falta das “tarifas dinâmicas” pode trazer algum viés às análises, porém, tendo em vista que as companhias não divulgam os parâmetros deste cálculo, justamente para preservá-los como um diferencial competitivo, o tratamento completo deste aspecto requereria, além da definição de quais e quantas viagens seriam realizadas nestes horários, a utilização de uma técnica para emular o mecanismo dinâmico, possivelmente através da introdução de um termo multiplicador (de majoração) aleatório nas equações, definido por sorteio probabilístico a cada iteração.

Outro aspecto que pode ser melhor explorado é a multiplicidade de dimensões do conceito de equidade. Enquanto o trabalho trata apenas da equidade socioeconômica, através da relação da acessibilidade com a renda, aspectos como raça/cor e gênero, por exemplo, podem ser incorporados na análise para identificar como a distribuição de acessibilidade varia entre regiões com diferentes proporções raciais ou entre mulheres e homens. Mais ainda, uma lente interseccional pode ser aplicada para identificar como a acessibilidade altera-se quando dois ou mais desses fatores sociais interagem.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2024

Histórico

  • Recebido
    15 Ago 2023
  • Aceito
    5 Out 2023
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